sexta-feira, 29 de maio de 2020

Cristina Ferreira - Crónicas III (29MAI2020)




NÃO DEIXAR NINGUÉM PARA TRÁS

Helena Pinto, Dirigente do Bloco de Esquerda e Vereadora da Câmara de Torres Novas afirma que "Desconfinemos mas com prudência e sem deixar ninguém para trás pois entramos numa nova fase do desconfinamento". O clima ajudou, com sol e calor parece que tudo se torna mais fácil. As lojas abriram, os cafés e restaurantes, as esplanadas, podemos ir à praia e passear, as famílias reencontram-se.

Nada de abraços e beijos, mas estamos mais perto uns dos outros, é um facto.

Os números da doença estabilizaram e salvo algumas situações particulares, parece que a coisa está controlada, felizmente.

Estamos na fase de nos habituarmos a usar máscara, de resistir a furar o distanciamento social, novas regras e novos hábitos que, como sabemos, não são automáticos. É tempo de prudência pois qualquer deslize pode prejudicar tudo e não conseguimos prever as consequências de um recuo. Penso sinceramente que estamos a dar provas coletivas de que seremos capazes de superar esta fase.

Mas superar esta fase tem também outras implicações. Aqueles e aquelas que ficaram sem emprego ou perderam rendimentos não podem ficar para trás. O facto de a situação sanitária estar melhor não pode significar que as medidas de apoio que foram assumidas quer pelo Governo, quer pelas Autarquias possam ser retiradas. Se tal acontecer, se essa “almofada social” desaparecer, a crise será ainda mais profunda e ainda mais dramática.

É tempo de prolongar no tempo todas as medidas de apoio e é tempo de encontrar e desenvolver novas medidas no apoio aos desempregados/as, no apoio ao comércio local e aos produtores locais, no apoio às famílias, no apoio às crianças para que nenhuma seja prejudicada pelas mudanças verificadas na educação, no apoio aos mais velhos.

É tempo de aprender com as crises que já vivemos. Agora é tempo de ligar os apoios à população com o desenvolvimento do território e são as autarquias que melhor posicionadas estão para esta tarefa. Terão também que mudar de hábitos, sobretudo as maiorias absolutas. O debate democrático e sem preconceitos deverá ser a regra. A transparência nas decisões e procedimentos é fundamental para criar confiança.

Os próximos tempos dirão quem está à altura para vencer as várias fases desta pandemia.
A coordenadora do Bloco de Esquerda, Catarina Martins, apresenta as prioridades do Bloco de Esquerda para estabilizar o país no pós-pandemia.

A primeira medida é a necessidade de garantir aos trabalhadores o seu salário a 100%. “Não é possível dizer aos trabalhadores que vão viver até ao final do ano com menos 30% de salário”, situação que aconteceria se a medida atual de lay-off fosse estendida até ao final do ano, sem qualquer alteração e isso só será possível se implementada uma medida de apoio ao emprego, financiada pelo Estado e pelas empresas, para pagar a totalidade do salário dos trabalhadores. 

A segunda medida é a necessidade de proteger os trabalhadores precários, que não estão abrangidos nas atuais medidas de lay-off. “Há muitas empresas que estão a receber apoio público (algumas até, grandes empresas do nosso país) que despediram trabalhadores precários”, lembrou a coordenadora bloquista. 

Não deixar ninguém para trás significa não repetir o erro feito com o Novo Banco, neste caso a TAP, “em que nós pagamos e não mandamos”, injetamos milhões e o Estado não pode mandar ou exigir um escrutínio democrático.

Catarina Martins afirma que na Europa existem os recursos necessários para responder à crise e que o “lay-off não será mais caro do que salvar bancos”. Se há disponibilidade para salvar o sistema financeiro de cada vez que entra em crise, agora, quando há uma crise sanitária, é necessário proteger o essencial: “o emprego, o salário, a casa, os bens essenciais”.

Por outro lado, não é aceitável que se apoiem empresas que despedem precários” pois “Não é aceitável que se apoiem empresas que despedem precários” ou que estas distribuam dividendos nesta altura. Além disso, acrescentou a necessidade de proteger a Segurança Social e o Serviço Nacional de Saúde. 

Catarina Martins disse que o “Bloco de Esquerda estará envolvido no debate e na resposta aos desafios que temos sem deixar ninguém para trás.  



Cristina Ferreira, 29/05/2020


sábado, 16 de maio de 2020

Cristina Ferreira - Crónicas III (16MAI2020)







ESTRANHO MUNDO ESTE

Estranho mundo este: no turbilhão de voltas e reviravoltas que a pandemia do COVID19 provocou, tanto sociais como económicas, eis que surgem notícias que mostram as movimentações dos bastidores da sociedade portuguesa, bem como as movimentações dos meios de comunicação social para as explorar até ao limite da miséria e dor.

Vejamos o caso do assassinato de Valentina, explorado até ao limite, pela comunicação social quando já eram repetitivas as notícias sobre o desenvolvimento da pandemia no país, as diversas doações de máscaras e gel desinfetante, o agradecimento aos profissionais de saúde, o regresso às aulas, as entregas de computadores por parte das autarquias, e tantos outros que, de serem repetidos e dissecados, cansaram e, em alguns casos deram origem a algumas confusões como, por exemplo, a ideia de que que os idosos não podiam sair de casa. Muitas vezes a informação foi desinformação, muitas vezes foi o canal para dar cara a muitas fobias e inflamar opiniões e julgamentos. A crise sanitária deu lugar à crise social, mostrou as emergências de uma sociedade fragilizada tanto a nível social como económico.

O relatório apresentado pela Estrutura de Monitorização do Estado de Emergência (EMEE), coordenada pelo Ministro da Administração Interna, apresenta um conjunto de conclusões sobre os efeitos da pandemia realçando que, e passo a citar, “a crise social subsequente à crise sanitária” e apesar dos mecanismos implementados pelo governo terem “contribuído para minorar as consequências nocivas resultantes, o decréscimo do emprego e a retração da atividade económica foram inevitáveis”.

O documento analisa também a questão da população idosa, e realça o reforço da “capacidade de realização de testes em lares de idosos, abrangendo tanto utentes como os respetivos profissionais” bem como o “esforço de alargamento de testes ao pessoal do serviço de apoio domiciliário e aos utentes e funcionários de lares não licenciados”.

Por fim, reiterou a necessidade de reabertura de serviços públicos essenciais, como por exemplo os tribunais, e “do regresso à normalidade ao nível da prestação de cuidados de saúde não relacionados com a COVID-19”. Também “os serviços públicos deverão ser um exemplo quanto à adoção de medidas de proteção que permitam o atendimento ao público em condições de segurança, o qual poderá ser duplicado pelo setor privado aquando da retoma da atividade”.

Enquanto a pandemia era a desculpa para as empresas despedirem o Novo Banco aumentou salário de gestores em ano de prejuízos pagos pelos portugueses e recebeu do Estado mais 850 milhões de euros, ou seja, do erário público, e pode ainda vir a distribuir bónus de 2 milhões após 2021. Além disso, ofereceu 320 mil euros ao novo administrador financeiro só para o contratar. No global, a administração executiva do banco auferiu 2,3 milhões de euros no ano passado. Uma realidade chocante mesmo para o universo privilegiado e protegido como é o da banca.

Se o presente é um problema para António Costa parece que o futuro não o vai ser.

Se António Costa dá Marcelo Rebelo de Sousa como sendo reeleito nas próximas eleições presidenciais, se Marcelo retribui o apoio e afirma que têm um espírito de equipa que ninguém vai quebrar, temos o esquema montado e a paga dos favores desta legislatura e uma mão lava a outra.

Até agora, só André Ventura, deputado do Chega, anunciou oficialmente a sua candidatura à Presidência da República.

E termino com estes dois estados de emergência política, bastante preocupantes por sinal, pois ainda não há vacina, ou qualquer medicamento, para situações desta natureza.



Caixa Alta, Rádio Castrense

Cristina Ferreira, 16/05/2020



sexta-feira, 1 de maio de 2020

Cristina Ferreira - Crónicas III (01MAI2020)




LEITURAS DE MAIO

Ler é sempre um prazer e António Guerreiro, amante da leitura, faz uma reflexão sobre as suas leituras de quarentena:


Sempre que se fala de 11 de Setembro vem à memória da maioria das pessoas o ataque às Torres Gémeas do World Trade Center de Nova Iorque. É uma data incontornável da história recente e portanto nada de estranhar. A mim, no entanto, quando se fala de 11 de Setembro o que primeiro me ocorre não é o de 2001 mas o de 1973.

No dia 11 de Setembro de 1973, em Santiago do Chile, Augusto Pinochet, apoiado pela CIA, lança um golpe de estado sobre um governo democraticamente eleito, do qual viria a resultar a morte do Presidente Salvador Allende e a implementação do regime ditatorial liderado pelo General até Março de 1990, durante o qual desapareceram e morreram muitos milhares de pessoas.

Recentemente, a 16 do corrente faleceu em Oviedo, em Espanha, vítima da recente pandemia, um dos homens que a 11 de Setembro de 1973, fazia no Palácio de La Moneda em Santiago, guarda a Salvador Allende. Homem multifacetado, foi de tudo um pouco: realizador; jornalista; activista político chileno; membro das Brigadas Sandinistas na Nicarágua que derrubaram Anastácio Somoza foi, no entanto, como escritor que mais se notabilizou. Chamava-se Luís Sepúlveda.

Um verdadeiro “trota mundos”. Depois do golpe militar de Pinochet teve de abandonar o Chile e andou, sempre na luta, pelo Brasil, Uruguai, Paraguai, Peru. Viveu na Alemanha e em Espanha. Viveu entre os índios no Equador e na Amazónia tornou-se amigo de Chico Mendes a quem dedicou uma das suas mais conhecidas obras: “O velho que lia romances de amor”.

Sou desde há muito um grande admirador da sua obra e creio que posso dizer sem falsas modéstias que, não só li, como possuo praticante toda a sua obra literária. Já durante o recolhimento imposto pelo novo coronavírus li aquele que, julgo, terá sido o seu último livro “História de uma baleia branca”, publicado em Portugal em Maio de 2019.

De entre a sua vasta obra destacaria, sem qualquer novidade, já que me parece ser consensual: “O velho que lia romances de amor”; “Patagónia Express”; “Mundo do fim do mundo”; “História de uma gaivota e do gato que a ensinou a voar” e o meu preferido “As rosas de Atacama”, livro de pequenos contos publicado em 2000 e que já li por várias vezes.

Nestes tempos de reclusão mais ou menos obrigatória, mais ou menos voluntária, dou por mim a passar cerca de 23 horas por dia em casa e a minha actividade principal é, justamente, a leitura.

Na primeira parte desta crónica lembrei Luís Sepúlveda e agora, sem pretensões de fazer concorrência ao Presidente Marcelo Rebelo de Sousa – ele lê 20 livros por semana que serão mais ou menos os mesmos que eu li até agora desde que começou o confinamento – gostaria de referir alguns dos que li, isto partindo do princípio que alguém se interessará por isso.

- O oficial e o espião, de Robert Harris que relata o “Caso Dreyfus” passado no final do século XIX e princípios do seculo XX e que serviu de inspiração ao recente filme “J`acuse”, de Roman Polanski. Muito bom.

- 2 livros de Ildefonso Falcones, escritor catalão de romances históricos: “A catedral do mar” e “O pintor de almas”. Muito bons.

- Hippie, de Paulo Coelho. O homem farta-se de vender milhões de livros em todo o mundo e eu tento perceber porquê e então vou insistindo. Mais uma decepção, mais uma porcaria. 
- Pensava eu que já tinha lido tudo de Steinbeck, mas esta coisa da internet é realmente maravilhosa. Então não é que fui descobrir 4 que não tinha? Já li 3 “Chama devoradora”; “Bairro de lata” e “Um dia diferente”. Todos belíssimos.

- Fui descobrir na biblioteca do meu camarada e amigo Toy Gonçalves numa edição de 1972, “Vietnam – A chacina de My Lay”, relatado na primeira pessoa pelo Tenente William Calley um dos mandantes e executantes da referida chacina, em que foram assassinados a sangue frio mais de 500 mulheres, crianças e velhos. Vale o que vale, é a sua versão dos acontecimentos.

- Papillon de Henri Charrière, que deu origem ao filme de Franklin J. Schaffner de 1973 com Steve Mc Queen e Dustin Hoffman e que conta as tentativas de fuga de Papillon dos campos de trabalhos forçados da Guiana Francesa. Se o filme era bom, o livro como é habitual é muito melhor.

E pronto, já chega, fico-me por aqui que vocês já devem estar para aí a dizer: “Mas o que é que eu tenho a ver com o que este tipo lê? Também deve ter a mania que é intelectual.



VIVAM OS TRABALHADORES DE TODO O MUNDO

VIVA O 1º DE MAIO




António Guerreiro/Cristina Ferreira, 01/05/2020