sexta-feira, 28 de maio de 2021

Cristina Ferreira - Crónicas IV (28MAI2021)

 



JUSTIÇA NA RESPOSTA À CRISE

 

Foi o lema XII Convenção do Bloco de Esquerda, que decorreu em Matosinhos, nos 22 e 23 de maio.

Destacou-se o debate plural numa Convenção em que estiveram em debate as ideias de cinco moções de orientação, pois o que une o Bloco de Esquerda é a política não o pensamento único ou a devoção a um ritual.

No plano político há o objetivo declarado da direita de “aniquilar a força popular da esquerda” com o apoio das “fake news e a intoxicação,” mas “Eles medem-se pelo ódio, nós medimo-nos pelo respeito. Eles escolhem o pântano, nós usamos a transparência”.

Assim o Bloco deve afirmar-se como “a força contra o pântano da desigualdade e do empobrecimento, contra o atraso e a arrogância dos poderosos”. E essa “desistência da direita” significa que “toda a política nacional será determinada pela força da esquerda para conseguir as soluções para o país” e que o Bloco "é e será a barreira contra a direita e a extrema-direita".

“Cuidar da qualidade do emprego é a primeira medida para sair da crise”, mas também investir na saúde e proteção social, pois “Existe uma alternativa à esquerda contra o marasmo” em que o país caiu.

Quanto ao emprego, há que reforçar a necessidade de leis laborais “fortes” para que “o investimento se traduza em mais salário”. Isso passará por “repor os direitos contra o despedimento, combater o trabalho temporário, garantir contrato efetivo contra a precariedade, recuperar carreiras no público como no privado”.

A “justiça na resposta à crise”, que foi o lema desta Convenção, passa por mais justiça fiscal, pois “Em Portugal, é mais fácil encontrar uma agulha no palheiro de um grande devedor, do que um milionário que pague todos os seus impostos”; a “justiça fiscal deve  começar pela medida de igualdade de tratamento de todos os tipos de rendimento, é a condição para o país aliviar os rendimentos médios enquanto financia um plano de habitação, a transição climática no tempo certo e uma transição social para o pleno emprego”.

“Transparência, responsabilidade, responder pela habitação e pelo clima, combater as desigualdades. É essa a força e responsabilidade do Bloco de Esquerda em cada autarquia, em todo o país”, é esse o patamar de exigência do terceiro maior partido do país e a responsabilidade das mudanças da política em Portugal.


Caixa Alta, Rádio Castrense

Cristina Ferreira, 28/05/2021



sexta-feira, 21 de maio de 2021

Cristina Ferreira - Crónicas IV (21MAI2021)

 



RECORDAR CATARINA

 

Passou, a 19-05-2021, mais um ano sobre a data do assassinato de Catarina Eufémia, concretamente o 67º.

Nascida a 13 de fevereiro de 1928 no Monte do Olival – Baleizão, filha de trabalhadores agrícolas. Desde muito nova começou a trabalhar em casa e na adolescência na agricultura, dedicando-se a fazer um pouco de tudo como era normal na altura, desde a monda, à ceifa, à apanha da azeitona etc. e como também era normal naqueles tempos, não frequentou a escola.

Com 17 anos casou com António Joaquim do Carmo que era operário na Companhia União Fabril (CUF) e mudou-se para o Barreiro. António viria a ser despedido e regressaram a Baleizão, ela voltou aos trabalhos agrícolas e ele tornou-se cantoneiro.

A 19 de Maio de 1954, e na sequência de uma manifestação de trabalhadores agrícolas que reivindicavam melhores salários e melhores condições de trabalho, Catarina que liderava um grupo de ceifeiras viria a ser assassinada pelo tenente Carrajola da GNR de Beja. Catarina era mãe de três filhos e contava somente vinte e seis anos de idade.

O assassino foi a julgamento, mas seria absolvido. Justificação: a morte terá sido causada por um tiro acidental. Curioso, quando a autópsia viria a revelar que Catarina foi atingida por três tiros.

A campa de Catarina Eufémia, no cemitério de Baleizão tem uma lápide onde se pode ler que Catarina Eufémia seria militante do Partido Comunista Português.

Recordo aqui que, há alguns anos e na presença de Francisco Louçã, o marido de Catarina, então ainda vivo, António do Carmo, conhecido em Baleizão por Carmona afirmou que Catarina nunca teve qualquer filiação partidária.

Com ou sem filiação partidária, é bom que não se perca o hábito de homenagear Catarina, símbolo de oposição ao Estado Novo e da luta contra a exploração dos trabalhadores.

E foi isso que, mais uma vez, ocorreu a 19 de Maio em Baleizão por parte do Bloco de Esquerda que homenageia também neste dia o seu sobrinho Manuel da Saudade, dinamizador da UCP “Terra de Catarina”.

Se é verdade que mudaram os tempos, que o Estado Novo caiu em 25 de Abril de 1974 ainda não mudaram os hábitos de exploração dos trabalhadores, como se pode verificar, por exemplo no que se passa no concelho de Odemira com os [trabalhadores] imigrantes vítimas das máfias de tráfico humano ao serviço do lucro dos patrões.

É por isso que temos de recordar Catarina e a sua luta para que, de uma vez por todas, acabemos com exploração do homem pelo homem.

 

                                                                  HONRA A CATARINA

 

Caixa Alta, Rádio Castrense

Cristina Ferreira / António Guerreiro, 21/05/2021


sexta-feira, 14 de maio de 2021

Cristina Ferreira - Crónicas IV (14MAI2021)




 

EDUCAÇÃO, FORMAÇÃO, INOVAÇÃO: O TRIPÉ DOS DIREITOS SOCIAIS NA EUROPA

 

O verdadeiro tripé para fazer crescer a Europa dos direitos sociais, ao mesmo tempo que cresce a economia europeia, estará na educação, na formação e na inovação, afirma Ricardo Arroja, colunista do ECO

“A cimeira europeia ocorrida há dias no Porto cumpriu o objectivo proposto, mas a papinha já estava toda feita (…) e Portugal teve a felicidade de ter sido o palco escolhido para a ocasião. Ainda bem para Portugal e em particular para a cidade do Porto que desta forma ficará associada ao plano de acção da Comissão Europeia, que de futuro fará a implementação do chamado pilar europeu dos direitos sociais. Mas há uma dúvida que permanece: será a Europa capaz de se afirmar simultaneamente do ponto de vista social e económico?

A União Europeia é reconhecidamente a região do mundo onde os direitos sociais são mais valorizados. O Estado social é uma criação europeia, que década após década tem vindo a ser reforçado. Todavia, a Europa é também um continente em declínio demográfico e sem o vigor económico de outras geografias. Em 2012, no auge da crise europeia, (…) a Europa representava 7% da população mundial, 25% do PIB e 50% da despesa social. A pungência dos números fala por si e em geral os números são o melhor antídoto contra a retórica vazia. Sendo certo que a convergência não pode ser apenas económica (…), a verdade é que quando falamos dos direitos sociais, em particular nos países que menos têm crescido, voltamos sempre à mesma discussão: como conciliar a produção de rendimentos com a sua distribuição?

A resposta à questão anterior depende crucialmente do que queiramos considerar ao falarmos de direitos sociais. O pilar europeu dos direitos sociais foi lançado em 2017 na cimeira de Gotemburgo. Foram então enunciados os princípios, mas faltava a concretização e um plano de acção para lá chegar. A intenção de concretizar chegou agora pela mão da Comissão Europeia e dos vinte princípios definidos no pilar europeu dos direitos sociais avançou-se para três objectivos concretos a atingir até 2030. E estes objectivos são:

1-           Taxa de emprego de 78% (…)

2-           Pelo menos 60% de adultos a frequentar acções de formação todos os anos;

3-           A redução de pelo menos 15 milhões de pessoas ao grupo de pessoas em risco de pobreza ou exclusão social, incluindo no mínimo 5 milhões de crianças.

O acesso à educação, tanto na juventude quanto na idade adulta, é a principal alavanca para uma política de direitos sociais. É a educação que permite às pessoas evitarem a exclusão e o desemprego. É também a educação que possibilita o elevador social que, em particular para as crianças de famílias desfavorecidas, constitui o passo decisivo rumo a uma vida de sucesso. Parece-me, portanto, muito bem que o financiamento público da educação e da formação contínua seja dotado de meios reforçados.

Contudo, é igualmente importante que este financiamento vá de encontro aos seus efectivos beneficiários, isto é, as pessoas que vão usufruir da oferta educacional, em vez de se perder pelo caminho. No que diz respeito à formação contínua, o objectivo da Comissão Europeia é muito ambicioso. Trata-se de quase duplicar a proporção de adultos em aprendizagem permanente (…)

A educação é hoje equiparada a um bem público. O seu financiamento (público) é consensual em toda a Europa, existindo apenas discórdia sobre o modo de prestação da mesma e sobre a forma como os recursos chegam ao utente. Alargar o financiamento público da educação à chamada formação ou aprendizagem contínua será, portanto, uma mera extensão da mesma lógica que preside ao apoio público nos restantes níveis de ensino. O desafio estará depois na oferta de formação que faça sentido. (…). Todavia, do que hoje se fala é de um crescimento baseado em inovação e aqui a experiência mostra que o modelo social da Europa não tem sido tão feliz quanto outros modelos de outras regiões do mundo.

(…)  

As medidas assistenciais de prevenção do risco de pobreza são importantes, sobretudo no caso das crianças que não decidem sobre os ambientes frequentemente desfavoráveis em que nascem. Mas o verdadeiro tripé para fazer crescer a Europa dos direitos sociais, ao mesmo tempo que cresce a economia europeia, estará na educação, na formação e na inovação.”

(https://eco.sapo.pt/opiniao/o-pilar-social-e-a-economia/)

 

Caixa Alta, Rádio Castrense

Cristina Ferreira, 14/05/2021


sexta-feira, 7 de maio de 2021

Cristina Ferreira - Crónicas IV (07MAI2021)

 



GERAÇÕES DE IDOSOS À RASCA

 

“O que o país alheado da realidade descobriu com os milhares de mortes nos lares não se muda com melhores lares. Muda-se com mudança de muitas coisas na sociedade para que a cidadania e os direitos dos mais velhos sejam o princípio e não a exceção, afirma José Manuel Pureza, Deputado e Vice-Presidente da Assembleia da República. Dirigente do Bloco de Esquerda e professor universitário, no artigo publicado no diário “As Beiras”.

Em fevereiro, o país descobriu o que já estava escancarado há muito tempo. Os milhares de mortos nos lares puseram em evidência as condições extremamente precárias de uma grande maioria deles, limitados a serviços mínimos de depósitos de pessoas passivas e infantilizadas. O país confrontou-se com o que já devia saber há muito: em vez de investirmos na autonomia segura dos mais idosos, deixámos que se instalasse uma atitude geral de armazenamento dos velhos, desaproveitando a sua sabedoria e a sua experiência de vida. E essa atitude animou uma economia, a dos lares e centros de dia, certamente a mais pujante em muitos territórios abandonados pelo investimento público e sobre a qual se criaram polos de poder local personalizado e malhas de negociação política privilegiada entre o local e o nacional.

O país sabia disto tudo e deixou andar porque isso convinha às redes de poder assim estabelecidas. Os mais idosos são, há muito tempo, uma geração à rasca. Tantas, tantas vidas apoiadas em pensões abaixo do limiar de pobreza, com habitações sem a mínima qualidade, a levar em cima todas as fragilidades do Serviço Nacional de Saúde. Universo pobre, desconsiderado, desrespeitado.

À geração à rasca dos jovens precários o país respondeu ofensivamente com o convite à emigração. A sucessivas gerações à rasca dos idosos o país respondeu irresponsavelmente com o armazenamento e a infantilização em lares. A institucionalização para a passividade e para a dependência foi o rosto da demissão da sociedade e do Estado para com os mais velhos.

Precisamos de uma bazuca de vontade política para termos uma sociedade e um Estado onde os mais velhos não sejam um peso, mas sim ativos de experiência e de saber. Para ser assim, a um tratamento baseado no depósito e na infantilização tem que se contrapor um tratamento baseado na cidadania e nos direitos. Isso materializa-se em descentralização dos serviços públicos, em programas de apoio domiciliário, em políticas de adaptação das habitações, na criação de condições para a mobilidade nas cidades, em gabinetes de apoio em todas as freguesias para combater a infoexclusão. E sempre, mas sempre, uma valorização das pensões fazendo convergir as mais baixas com o salário mínimo, e um alargamento do acesso ao Complemento Solidário para Idosos.

O que o país alheado da realidade descobriu com os milhares de mortes nos lares não se muda com melhores lares. Muda-se com mudança de muitas coisas na sociedade para que a cidadania e os direitos dos mais velhos sejam o princípio e não a exceção. Mudar a sociedade para os mais velhos e para os mais novos, não menos que isso.”

 

Artigo publicado no diário “As Beiras” a 4 de maio de 2021

Sobre o autor: José Manuel Pureza - Deputado e Vice-Presidente da Assembleia da República. Dirigente do Bloco de Esquerda, professor universitário.

 

Caixa Alta, Rádio Castrense

Cristina Ferreira, 7/5/2021

 

sábado, 1 de maio de 2021

ESTAFADOS...





... é um curto documentário que retrata a agudização da precariedade laboral e das profundas transformações das relações de trabalho.

As mais recentes tecnologias de informação, telecomunicações e poder computacional, proporcionam, indiscutivelmente, grandes avanços nos mais variados setores da nossa sociedade.

Se nalgumas vertentes, a promessa de um mundo melhor foi cumprida, noutras, esbarra na ganância desmedida do grande capital, como a vertente sócio laboral, aproveita para desregular o mercado de trabalho, retirar direitos, quebrar os trabalhadores e as suas organizações. A cada novo passo tecnológico, sempre assim aconteceu, sem novidade, portanto, quantos aos seus objetivos... Porque haveria de ser diferente agora?

Comparadas às anteriores, a surpresa nas transformações atuais, reside na quantidade e velocidade com que acontecem e na falta de um rosto para quem comanda: é o algoritmo; é a plataforma…

O vídeo Estafados, mostra-nos o cotidiano de uma restrita classe de trabalhadores, subordinados a uma relação de trabalho com enormes e bem-sucedidas corporações, mas só até que haja lucro, porque nas perdas, os milhares de trabalhadores e trabalhadoras, são patrões de si próprios.

São pouco menos de seis minutos e meio de documentário focado nos testemunhos de alguns estafetas, mas que podem ser extrapolados para outros campos profissionais. Vale a pena ser visto.

 

Filipe M Santos

Almodôvar, 01 de maio de 2021


Cristina Ferreira - Crónicas IV (30ABR2021)

 

Foto: Paulete Matos (em Esquerda.Net)


DIA DO TRABALHADOR - 2021

 

Podemos afirmar que a Greve Geral de 1886 e a manifestação de 500 mil trabalhadores em Chicago nos Estados Unidos, são os eventos percursores que deram origem ao 1º de Maio – Dia do Trabalhador.

Esta efeméride é celebrada em Portugal desde 1890, o primeiro ano da sua realização internacional, e veio a evoluir, adquirindo características de ação de massas a par de um sindicalismo cada vez mais reivindicativo, consolidado e ampliado.

Cumprem-se 135 anos desses primeiros eventos, os primeiros passos na resposta à completa desregulação das relações laborais à época, prenunciadas por Karl Marx, na sua obra, agravadas pela transformação das cadeias produtivas por força da mecanização, ao invés de conduzir a uma maior libertação do Homem.

Em Portugal, 1974 é eventualmente o ano do 1º de Maio mais extraordinário alguma vez realizado, tal como o testemunhou o jornal Comércio do Porto que lhe dedicou uma edição especial. Em 1962 a relevante e carregada de simbolismo celebração do Dia do Trabalhador, apesar das proibições e repressão do Estado Novo, trouxe à rua em algumas cidades, manifestações de centenas de milhares de trabalhadores, percussoras das revoltas dos assalariados agrícolas que com a sua luta conseguiram obter a redução da jornada de trabalho para oito horas diárias. Já antes, em 1919, os trabalhadores do comércio e da indústria haviam conquistado a jornada de oito horas.

Muitas outras conquistas foram alcançadas, fruto de muitas lutas e cada uma delas justificam a celebração do Dia do trabalhador. A humanização dos horários de trabalho, a melhoria dos salários, a segurança, a qualificação, a previdência são exemplos entre tantas outras.

Celebrar o 1º de Maio, é lembrar todas as lutas travadas contra o capital e lembrar as conquistas alcançadas. Mas é também perspetivar os desafios presentes e futuros.

Vivemos novas formas de trabalho e consequentemente, novas formas de redução de direitos, nem sempre tão evidentes, mas que ameaçam o equilíbrio laboral, social e económico. O fenómeno Uber, em que o motorista é, sem outra possibilidade de escolha, o seu próprio patrão, é um exemplo disso mesmo. Ou mesmo o trabalho à distância, dito “on-line” que esbate as linhas de espaço, de tempo e de recursos entre a vida no trabalho e fora dele.

A indústria, os serviços, a economia estão a transformar-se por força da computorização, informatização e robotização dos processos, e a crise pandémica tem-no impulsionado ainda mais.

Estamos em “Uma nova era de escravidão digital”, considera Ricardo Antunes. Segundo este sociólogo brasileiro, “Estamos em uma fase tão destrutiva do capitalismo financeiro que a exigência que sua lógica tenta nos impor, em escala planetária, é a do trabalho cada vez mais flexível, sem jornadas pré-determinadas, sem espaço laboral definido, sem remuneração fixa, sem direitos, nem mesmo o direito de organização sindical. É desse modo que o capitalismo informacional, digital e financeiro vem aprimorando a sua engenharia da dominação.”

Estamos no momento de viragem do trabalho: o chamado Trabalho 4.0 e serão muitos os desafios para superar. Não é, por isso, descabido fazermos do 1º de Maio o Dia do Trabalhador 4.0.

 

Caixa Alta, Rádio Castrense

Filipe M Santos/Cristina Ferreira, 30/04/2021