AS DESIGUALDADES E OS EFEITOS PANDÉMICOS NA EDUCAÇÃO
“As
desigualdades emergem nas pandemias, reflectem-se nas respostas colectivas e
são um espelho das nações. E recorde-se, ainda como ponto prévio: o rating dos
países é essencial para os desafios de curto e médio prazos, porque, se for
bom, permite dívida a juros favoráveis e estimula défices baixos ou superavits.
No entanto, não admite repetidas recessões. Responde melhor nas crises se
decorrer da consistência histórica na transformação de políticas, empresas e
instituições extractivas (que acumulam a riqueza em oligarquias e “elites”) em
inclusivas (que distribuem a riqueza e reduzem as desigualdades). Apesar das
regiões europeias serem historicamente diversas neste domínio, espera-se que os
erros cometidos na crise de 2008 não se repitam na covid-19: para salvar vidas,
recuperar economias e manter a paz.
Estamos
num período de quebra consentida do raiting porque atingiu todos. Mas essa
tolerância contrapõe o não encerramento das escolas nas regiões em que o seu
papel central é assegurar a força laboral das classes média e média baixa e dos
pobres. É, infelizmente, pouco rigoroso convocar a urgência das aprendizagens.
Essas escolas só são vitais no curto prazo para a economia; apesar de se temer
que influenciem a subida dos contágios.
A
pandemia expôs o fenómeno. As turmas, e escolas, numerosas são um dos
indicadores extractivos que comprometem a redução das desigualdades e dos
efeitos pandémicos. Olhemos para outros três: a escola a tempo inteiro e a
falta de professores, onde se espera uma “vacinação” no quadro europeu até
2030, e a gestão do território que exige uma “terapêutica” mais prolongada.
A
escola a tempo inteiro substitui valências assistencialitas, sociais e
culturais que nas nações com bom raiting consolidado estão cometidas à
sociedade. É por isso que essa “impossível” missão falha na redução das
desigualdades. Basta reparar no calendário escolar. É sensato interromper as
aulas a cada seis semanas para recuperar energias; mais ainda em tempos de
pandemia. É um modelo usado em regiões da Europa com mais sociedade. Em tempo
normal, as interrupções podem ser usadas para semanas de teatro, cinema,
conferências e exposições da responsabilidade da sociedade para a emergência de
novos públicos. Por cá, nem a pandemia questionou o que existe. O Governo
anunciou, como se a covid-19 fosse assunto em via de resolução, mais dias
lectivos e menos dias de interrupção (…).
Já
a falta de professores reflecte o desprezo por um dos pilares da escola
democrática. Agora que a pandemia evidenciou que está longe a substituição de
professores por máquinas, olhemos para o tal exemplo finlandês, também na
pandemia, para se perceber o que nos falta fazer. A Finlândia tem um século de
independência e “mandatou” os professores para a construção da identidade
nacional. Confiam nos professores. Desconhecem a lógica desastrosa do “cliente
tem sempre razão” aplicada à escola. Não há avaliação do desempenho. A carreira
tem dos mais elevados índices remuneratórios do sector público. A formação
inicial é prestigiada. Não existe inspecção. E há estabilidade. Os excessos
ideológicos das políticas educativas dos governos de Sócrates e Passos Coelho
eram impossíveis na Finlândia. Os bons resultados internacionais mediatizaram
um ensino centrado no professor. Em 2012, começaram a estudar a flexibilização
curricular e só em 2016 deram os primeiros passos. A opinião dos professores
conta. As escolas têm uma dimensão civilizada e desburocratizada. Perceberam
que o imobilismo é uma irresponsabilidade perante a quarta revolução
industrial. Mesmo que os professores não constem das tabelas (…) das profissões
mais ou menos propensas à automatização, existem alunos com futuros
profissionais. Foi o que os levou a pensar em mudanças devidamente testadas.
Por
fim, a boa gestão do território é um factor estruturante para a redução das
desigualdades. (…) As correcções são cada vez mais difíceis. A (des)organização
do território em Portugal inscreveu aglomerados populacionais (…) que anulam a
necessária miscigenação escolar dos grupos sociais e comprometem o elevador
social que fortalece a classe média. O que temos, acentua a guetização dos
desfavorecidos. Os grupos sociais mais fortes conseguem, naturalmente, que a
frequência das escolas fique entre pares e provocam a auto-exclusão dos mais
fracos; e é também por isso que se falha na redução das desigualdades e dos
efeitos pandémicos.”
Este
é um texto de Paulo Prudêncio, publicado no Blogue ComRegras, que leva à
reflexão sobre as desigualdades e os efeitos pandémicos na educação.
Fonte:
https://www.comregras.com/porque-se-falha-na-reducao-das-desigualdades-e-dos-efeitos-pandemicos-paulo-prudencio/
Caixa
Alta. Rádio Castrense
Cristina
Ferreira, 04/12/2020
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