sexta-feira, 6 de novembro de 2020

Cristina Ferreira - Crónicas IV (06NOV2020)

 



FALAR A VERDADE NÃO É PESSIMISMO

 

Alexandre Henriques, no Blogue Com Regras, afirma que as escolas estão a fazer (quase) tudo para evitar a propagação do vírus. As salas são desinfetadas frequentemente, há gel por todo o lado, as turmas estão organizadas por turnos ou com horários desfasados, existem circuitos de circulação, etc. Mas muito mais podia ser feito, desde a mudança para sistema misto de ensino (metade da carga letiva na escola, metade em casa; alternância semanal de alunos nas escolas); arejamento mais eficaz; pausas letivas ao longo do ano letivo para diminuir o contágio, etc…

Mas, em outubro o grupo etário dos 10 aos 19 anos foi claramente aquele onde o aumento foi mais expressivo, mais do que duplicando em apenas um mês. No final de setembro o país registava 4.216 jovens com estas idades que tinham sido contagiados, número que chegou aos 10.199 no final de outubro (+142%), um aumento brutal em plena idade escolar.

O vírus também se transmite nas escolas, tal como em todos os locais, pela simples razão que ninguém sabe o exato momento da transmissão do vírus. Os alunos não mudam de cor quando ficam contaminados, mas é bastante provável que a transmissão ocorra nos locais onde existem mais alunos e onde estes passam mais tempo… por isso respeitar todas as medidas de prevenção é essencial, tanto na escola como… em todo o lado pois num mês Portugal teve quase tantos infetados como em sete meses.

Este início de ano letivo tem sido muito duro nas escolas, para toda a comunidade escolar, professores, assistentes operacionais, afirma Rui Pereira.

O principal problema é sem dúvida a pandemia. Em primeiro lugar porque não se compreende porque os professores são a exceção na aplicação de medidas de combate à pandemia. Quem argumenta que os professores, como os médicos, devem estar na primeira linha, para salvaguardar o futuro das crianças e jovens, tem razão, mas depois ignora deliberadamente que os profissionais de saúde têm medidas de proteção que os professores não têm, como os fatos, enquanto lhes exigem que nem as regras mínimas sejam cumpridas, como distanciamento de segurança, falta de arejamento entre aulas com turmas grandes, professores de risco com doenças associadas sem teletrabalho, etc.

Sim os professores devem estar na primeira linha, mas com medidas de proteção adequadas e não ser carne para canhão. Além disso, os professores têm dualidades de critérios para situações de covid19 como só irem para isolamento profilático uns quantos alunos nuns casos, a turma toda noutros casos, mas nunca o professor. O objetivo disto é manter a escola aberta a qualquer preço, o que não tem impedido que esteja a aumentar o número de alunos com ensino à distância, que é considerado um parente pobre e bem.

Planeou-se o ensino misto para as turmas terem aulas só de manhã ou de tarde, com redução das aulas presenciais para 3/4, mas esta modalidade ainda não foi aplicada nem está prevista nos concelhos em emergência. Na educação planeou-se, ao contrário da saúde onde claramente o planeamento falhou, mas agora que era preciso passar ao ensino misto não se avança. Sr. Primeiro Ministro planear significa estudar vários cenários onde se coloca hipóteses e abordagens a ter face às mesmas, desde as mais favoráveis às com maiores dificuldades. Como aceitar que com tanta gente nos gabinetes que não haja uma previsão de um cenário pessimista. Se o staff dos gabinetes não serve para planear, o que está lá a fazer? Só tem direito às mordomias?

Mas se na educação se planeou um sistema misto e agora se hesita em aplicá-lo, há que dizer que o problema de falta de professores resulta de um deixar andar, ir navegando à vista e não planear as falhas sistémicas que possam vir a acontecer no sistema de ensino e a falta de professores é a mais grave. O facto de terem estado previstas ajudas de custo para professores deslocados num dos últimos orçamentos e nada ter sido feito mostra que o problema foi equacionado, mas deliberadamente ignorado.

Concluindo: a normalidade do ensino está a ser perturbada pela pandemia, com muitos estudantes em casa, em ensino à distância, pois se as escolas não são na maioria dos casos a origem dos surtos, estão a ampliá-los, porque as condições são propícias à transmissão ao não se respeitarem regras impostas a toda a sociedade

Como diz Eduardo Sá: “Falar verdade não é ser pessimista. Encarar a realidade é perceber até que ponto é legítimo termos esperança. Em tempos de pandemia os discursos otimistas são uma ilusão.”

 

Fonte: https://www.comregras.com/relaxem-a-transmissao-nao-se-faz-nas-escolas/

https://www.comregras.com/do-covid19-a-falta-de-professores-muitos-alunos-sem-aulas-presenciais/

 

Caixa Alta, Rádio Castrense

Cristina Ferreira, 06/11/2020


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